sábado, 30 de janeiro de 2010

(Something about James)

       Heather tinha um beijo macio e ansioso. Enquanto a tinha nos braços, Jesse tentou veemente tirar Ruby de sua cabeça, mas seus olhos escuros, solitários e inescrutáveis pareciam persistir em persegui-lo, quer ele fechasse os olhos ou não. Foi por impulso, quando ele abriu os olhos daquela vez, os lábios da lourinha colados contra seu pescoço, sua boca vermelha, e fitou ao longe. Quase que magnética a atração para os olhos da garota ao longe, que segurava um menino louro em seus braços. Olhos repletos de lágrimas.
        - Ruby... - ele sussurrou.
        Heather o soltou em um movimento rápido, piscando os olhos como se tivesse a completa certeza de que o rapaz não dissera aquilo.
        - O quê?
        - Me desculpe, Heather. Eu preciso ir. Tem alguém me esperando.
        Ele retirou suavemente os braços finos e alvos da garota de sobre si e a contornou, em direção à uma Ruby que chorava contra seu irmão pequeno. "Merda, merda, merda. Muito esperto estragar tudo assim", ele pensava enquanto seus sapatos estalavam contra a grama fresca.
        - Espere, Jesse - Heather guinchou, puxando o braço do rapaz.
        - Sério, Heather. Me desculpe.
        - Não! Ruby Ward? - ela exclamou, percebendo para onde era direcionado o olhar vidrado do rapaz que a estava beijando há pouco. - Você não deveria falar com ela!
        - Por quê?
        A menina se recompôs em um instante. Passou as mãos por sobre os cabelos, ajeitou a blusa cor-de-rosa que estava evidentemente amarrotada e respirou fundo, antes de fazer sinal para que Jesse a seguisse. Ele o fez. Retornaram para o mesmo lugar de antes, levemente discreto, escondidos por um grande carrinho de cachorro-quente.
        - Ruby era minha melhor-amiga há alguns anos. Ela e Roxanne. - ela murmurou, como se aquilo fosse a pior confissão que ela pudesse fazer. Fitou a feição confusa de Jesse por alguns instantes e acrescentou - É, eu sei. Não me orgulho de meu passado. Mas éramos melhores amigas. Sabe como é, nossos pais se conheciam desde sempre e nós éramos colocadas para nos abraçarmos desde quando nem sabíamos o significado de um abraço.
        Ela colocou uma mecha de cabelos dourados para detrás da orelha.
        - Tínhamos dezesseis anos quando o carro dos pais delas bateu. Não sobreviveram. E elas simplesmente ficaram esquisitas, não conversavam mais, não queriam mais sair comigo. Parecia que alguém havia tomado o lugar delas.
        - Acho que eu também não gostaria de sair, caso houvesse perdido meus pais.
        - Não é isto. Entenda, Jesse, Ruby ficou dois meses sem dizer nada. Literalmente nada. Não dizia 'Olá', 'Bom dia'... Nada, nem sequer um 'Obrigada'. Por favor, eu era a garota mais popular desta cidadezinha ridícula, tinha uma imagem a zelar. Não podia ser a babá de uma garota órfã.
        O rapaz pensou em dizer o quanto estava achando-a egoísta, mas não o fez.
        - Então eu parei de falar com ela. E ela surtou. Agiu como se eu fosse a errada da história, chorou, consolou-se com James... Essas coisas.
        - Espera - ele exclamou. Aquele nome lhe era incrivelmente familiar - James?
        - O ex-namorado dela.
        Aquele assunto passou claramente a interessar Jesse.
        - O que houve com ele?
        - Assassinado. Na frente dela.
        Jesse permaneceu fitando Heather de modo abestalhado. Saber disto havia atingido-lhe como uma mão aberta em sua bochecha. Tentou imaginar Ruby chorando por sob o corpo ensangüentado de seu namorado, mas aquilo o aterrorizava demais. Conseguiu apenas gaguejar uma palavra:
        - C-como?
        - Ninguém sabe. Na autopsia descobriram que houve uma grande pressão intracraniana, que liquefez seu cérebro. Chegou a um ponto que ele começou a sangrar. Olhos, nariz, ouvidos, boca... Ninguém sabe explicar. Ele apenas... Sangrou. Até a morte.
        A imagem retornou com o impacto de uma bofetada. Ruby apareceu novamente na mente do rapaz, fitando com olhos arregalados e inundados com lágrimas sofridas, enquanto o rapaz que ela amara sangrava e se contorcia. O grito de James ecoava pelo pensamento de Jesse, enquanto a imagem de uma Ruby apática lhe era marcada a ferro na memória.
        - Jesse?
        Ele percebeu que Heather o olhava de modo curioso.
        - Eu preciso ir. – ele balbuciou. A Ruby em sua mente havia encontrado forças em algum lugar e começara a gritar e chorar agora. Jesse cambaleou alguns passos na direção da verdadeira Ruby, que agora tinha suas lágrimas limpas por Benjamin, quando Heather lhe puxou bruscamente pelo braço esquerdo.
        - Como assim? Depois de tudo que eu lhe falei sobre ela, você ainda vai preferi-la a mim? – a garota perguntou em gritos irritados.
        - Definitivamente. – respondeu Jesse puxando em seguida a mão que ela estava segurando e andando decididamente na direção de Ruby. Estava claro quem ele queria. Claro até para Heather, que viu seus olhos se preenchendo por lágrimas odiosas enquanto Jesse Hooper se afastava.

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

(Jealous)


       
- Ruby?
        A garota olhou para baixo ao ouvir seu nome. Estava zonza.
        - Sim, Benny?
        - Você está bem?
        Ela não estava.
        Acenou positivamente com a cabeça por um breve momento e voltou-se para contemplar a cena que ela sabia que estaria incrustada em suas lembranças por tempo o bastante para enlouquecê-la: Jesse e Heather. Juntos. Se beijando.
        - Ruby?
        - Sim, meu amor? – ela olhou para seu irmão mais novo, ainda sentindo como se pertencesse a um plano diferente do qual estava naquele momento. Benjamin semicerrou os olhos por alguns segundos, fitando a irmã
        (Se beijando. Heather e Jesse)
        daquele modo incrivelmente analítico, que fazia com que o garotinho de seis anos parecesse muito mais velho e maduro.
        - Você está mesmo bem?
        - Sim.
        - Você não me parece bem.
        - Eu...
        (Se beijando)
        ... Preciso me sentar. – Ruby ofegou, andando com seu irmão na direção do banco mais próximo que ali havia. Sentaram-se ao lado de uma garota pouco mais velha que Ben, que estava concentrada em tomar seu sorvete de morango.
        - Isto é por que Jesse e Heather estão se beijando? – Benjamin perguntou para Ruby, sem tentar manter qualquer descrição.
        - O quê? – ela guinchou, cravando seus olhos em Benjamin pela primeira vez desde que havia visto o casal se beijando. Antes disto, sua íris acinzentada vagava por algum lugar longe dali – talvez com James – de um modo que havia assustado Benjamin.
        - Você gosta dele?
        - Não. Claro que não, Benjamin, de onde você tirou isto?
        - É que você o olha como...
        - Não – ela se pôs de pé, a irritação praticamente explodindo em sua cabeça. – Não me venha com esta, eu não olho para ele de modo algum.
        Ruby se sentiu por um instante como uma adolescente novamente, com toda aquela chuva de hormônios que caía por sobre ela. Sentiu vontade de chorar, quando percebeu que Benjamin já o fazia.
        - Ei – ela murmurou, sentando-se novamente a seu lado – Me desculpe. Eu não queria... Ah Ben, sinto muito.
        O garotinho soluçou contra o peito de sua irmã, que sentia vontade também de soluçar contra o peito de seu pai. Benjamin demorou para fazer cessar as lágrimas que desprendiam de seus olhos, mas quando o fez, fitou a irmã novamente com toda aquela seriedade madura.
        - Ele gosta de você, Rub.
        - Não. Não gosta – ela murmurou amarga. Por um instante, Benjamin pôde jurar que ela iria começar a chorar, mas ela não chegou a fazê-lo. – Ele diz tudo aquilo para que eu me sinta única e especial. Mas aposto que disse o mesmo para Heather. A diferença é que eu não caí na conversa barata dele.
        Ela soltou uma risada nervosa e Ben percebeu quando ela fitou novamente o casal aos beijos, próximos à barraca de cachorro-quente.
        - Eu gosto dele. – o garotinho murmurou.
        - Ele não é uma boa pessoa.
        - É sim. Você não pode dizer isto, sabendo só o seu lado da história. E se Heather quisesse dar um beijo nele, e não o contrário?
        Ruby fitou seu irmão caçula com certo espanto. Por um breve instante, as palavras proferidas por Benjamin Ward Júnior pareciam ter sido ditas pelo próprio Benjamin Ward pai. A garota percebeu novamente quando teve vontade de chorar.
        - Oh Ben...
        - O que foi?
        - Você se parece tanto com papai – ela sorriu, mesmo sentindo que poderia desabar em lágrimas a qualquer momento.
        - Você quer um abraço?
        Ela não respondeu. Levantou-se e pegou o irmão menor no colo, apertando-o com tanta força que por alguns instantes, Benjamin pensou que fosse ficar sem ar. Ela não quis soltá-lo, mesmo quando ele reclamou que queria voltar para o chão.
        - Você pode chorar se quiser, Ruby – ele murmurou ao ouvido da irmã.
        Foi o bastante.
        Ruby deixou seu irmão deslizar por seus braços suavemente em direção ao chão. Quando os pés pequenos de Benjamin tocaram a grama fresca, ela começou a soluçar enquanto as lágrimas desprendiam de seus olhos acinzentados.