sexta-feira, 6 de novembro de 2009

(Confusions)


        Jesse Hooper havia acabado de bater a porta da casa das irmãs Ward, quando Roxanne começou a gritar. A chuva rugia diante dele, impedindo-o de entender mais do que algumas palavras, como ‘irresponsável’, ‘ataques’ e ‘morto’.
        Um vento gelado acariciou-lhe a pele, e Jesse passou as mãos rapidamente por seus braços, procurando esquentar-se. Havia esquecido seu suéter de lã por sobre a cama perfumada de Ruby, quando estivera procurando Benjamin por lá. Havia tido uma breve oportunidade de analisar o local onde ela dormia, pensando em sua aparência delicada e adormecida.
        Ele não estava querendo realmente voltar para casa. Não iria fazê-lo. Iria apenas até seu quarto, pegaria algumas coisas e avisaria a Daniel para não esperá-lo acordado. Precisava procurar Benjamin, e estava completamente ciente dos ataques que estavam ocorrendo naquela cidade. Dezenove corpos drenados – Apenas garotas e crianças –, em um período de um mês.
        Estava ciente, também, de que logo as Ward perceberiam o que eles estavam fazendo ali. Não era uma mudança casual, para uma cidade pequena na Carolina do Norte, daquelas que raramente aconteciam. Os Hooper queriam, precisavam, da ajuda daquelas garotas.
        Jesse se viu diante da porta de sua casa. Encharcado e com frio. Levou as mãos aos bolsos, tocando as chaves do Plymouth herdado de seu padrinho Bill Hooper. Procurou mais fundo no bolso de seu velho jeans e encontrou um pacote de chicletes de menta, alguns cupons velhos, e um papel amassado com o telefone de uma garçonete loura – Heather ou Tiffany, ele não se lembrava ao certo – na qual ele dera em cima na noite anterior, depois que Ruby saíra de sua casa praticamente expelindo fumaça pelos ouvidos. No mais, o bolso de Jesse estava vazio. Nada de chaves de casa.
        - Oh, merda. – ele murmurou, batendo com os nós de seus dedos na porta de madeira escura. Chamou por seu irmão algumas vezes, mas não obteve resultado. A casa continuava a se erguer diante dele de modo intimidador.
        Jesse olhou para o relógio prateado que sempre usava no pulso. Ainda eram sete e meia da noite, mas a chuva havia deixado aquele dia com uma aparência tão cinzenta e escura que o rapaz poderia jurar que eram quatro da manhã.
        Ele pensou que sendo apenas sete e meia da noite, seu irmão poderia estar em qualquer lugar. Em algum mercado comprando ingredientes para suas preciosas panquecas matinais, ou em algum bar bebendo um pouco de cerveja. Mas conhecendo Daniel de um modo que apenas Jesse conhecia, ele teve certeza de que seu irmão seria otário o bastante para estar em casa, em plena segunda-feira à noite, provavelmente folheando alguns livros velhos de Esoterismo.
        Jesse recomeçou a bater na porta.
        - Dan! Eu sei que você está aí, seu nerd!
        Mas ele não obteve resposta, mais uma vez.
        Há alguns metros de distância do irmão, Daniel Hooper estava começando a se sentir incomodado com sua demora. Apenas visitar Ruby, era o que ele havia ido fazer. Para Dan, ele voltaria alguns minutos depois, carrancudo e sem querer dizer nada sobre qualquer uma das Ward. No outro dia tentaria conversar com ela novamente, e aquilo se seguiria até que Jesse deixasse de ser um cabeça-dura, ou até que Ruby se rendesse a seu charme.
        Com seus vinte e dois anos de experiência, assistindo enquanto o irmão conquistava todas as garotas da escola, Dan havia percebido que havia uma probabilidade de 99,9% de que a garota se rendesse antes que Jesse caísse na real.
        Mas talvez ele não fosse diretamente para casa. Era segunda-feira, o início de uma semana que provavelmente seria turbulenta. Jesse talvez houvesse ido para o bar, após levar um fora de Ruby. Talvez ele até chegasse em casa acompanhado naquela noite. Por aquela garçonete loura – Olive ou Evelyn, Daniel também não se lembrava – que havia dado em cima de Jesse descaradamente, a partir de quando ele colocara os pés no bar.
        - Ganhei! – ele ouviu uma voz infantil. Fitou então um garoto de seis anos, louro e sardento, que segurava um joystick velho diante de si. Estava a poucos passos de Daniel, sentado no chão da sala dos Hooper. Era a terceira vez que Benjamin Ward ganhava, mas Daniel não parecia estar se esforçando muito para nocautear o boneco ninja que Ben controlava.
        - Há algo errado? – ele perguntou, preocupado, parecendo-se um pouco mais velho do que realmente era.
        - Meu irmão não chegou ainda. Eu achei que ele não iria demorar.
        Ben colocou o joystick no chão encarpetado a seu lado, e se levantou. Andou até o sofá onde Daniel se encontrava sentado, e se acomodou próximo a ele.
        - Você acha que a mesma coisa que levou minha irmã... Levou seu irmão também?
        - Creio que não – ele respondeu com sinceridade. – Meu irmão sabe se cuidar.
        - Minha irmã também.
        - Ben... – Daniel colocou o seu joystick por sobre o braço do sofá branco no qual estava sentado. Entrelaçou suas mãos uma na outra, e fitou o garotinho louro a seu lado por alguns instantes – Como era o homem que levou sua irmã?
        - Alto. – Ben murmurou prontamente.
        - Ele era muito pálido? Com olhos vermelhos e dentes afiados?
        - Você está me perguntando se foi um vampiro que a levou? – o pequeno Benjamin franziu o cenho de modo confuso, deixando Daniel completamente petrificado.
        - Bem... Talvez.
        - Você acredita em vampiros então, Dan?
        - Bem... Por que não? – Dan gaguejou, apoiando seu queixo com uma de suas mãos. Ainda estava incrivelmente atônito com o fato de que o garotinho de seis anos diante dele, Benjamin, sabia caracterizar um vampiro perfeitamente. A maioria das crianças de sua idade apenas ficaria confusa.
        - Eu também acredito! Você acha que são os vampiros que estão matando as pessoas aqui na cidade? - Ben perguntou, com um brilho de curiosidade transparecendo por seus olhos. Daniel abriu a boca para responder o garoto, mas antes que qualquer palavra chegasse a ser pronunciada, ele ouviu seu celular fazendo um escarcéu dentro de seu bolso traseiro.
        Levou a mão em direção ao bolso, e percebeu que estava trêmulo com o interrogatório inesperado daquele menino.
        - Alô?
        - Seu filho-da-mãe!
        - Oi Jesse... Também é muito bom falar com você.
        Ao ouvir seu mais novo amigo pronunciar aquele nome, Benjamin se sentiu estremecer, mas não soube ao certo o motivo. Jesse lhe era incrivelmente familiar, em alguma coisa que envolvia também Ruby. Mas ele não se lembrava exatamente o que era.
        - Não me venha, Dan, onde você está?
        - Em casa... E você?
        Daniel Hooper afastou o telefone do ouvido por alguns instantes, quando foi bombardeado com palavrões vindos de seu irmão.
        - Eu estou na porta de casa, te gritando há quase meia hora.
        - Ah, sério? Desculpe-me. Sério. Eu juro que não ouvi... Eu estava...
        Ele parou bruscamente, corando e encarando o aparelho de televisão que mostrava mais uma luta que Ben ganhava, contra um bonequinho estático que era para ser Daniel. O silêncio do outro lado permaneceu por alguns instantes, até que Jesse começou a rir.
        - Você está brincando de vídeo-game?
        - Não!
        - Posso ouvir a música do jogo.
        - Bem... Talvez.
        O mais velho explodiu em gargalhadas.
        - Você é tão nerd!
        - Ora, cale a boca.
        - Tudo bem. O papo está incrivelmente interessante, sabe? Mas eu estou do lado de fora de casa, e estou encharcado. Quer fazer o favor de vir abrir a porta?
        - Estou indo.
        Ao dizer isto, Daniel apertou um pequeno botão vermelho em seu celular, desligando-o da conversa. Colocou-o novamente no bolso e se levantou, no mesmo momento em que a televisão anunciava a terceira vitória consecutiva de Ben.
        - Aonde vai?
        - Meu irmão chegou. Vou apenas abrir a porta para ele.
        - Que bom!
        O garotinho voltou a encarar a televisão, e começou a apertar os botões de seu joystick de um modo quase que desesperado, quando o bonequinho de Daniel se levantou, sangrando, e recomeçou a lutar. Por um instante, Dan achou que o garotinho sentado diante da televisão, com os olhos vidrados e um sorriso no rosto, era Jesse há quase vinte anos atrás.
        O irmão mais velho de Dan Hooper não havia brincado, quando dissera que estava encharcado. Por algum motivo – o qual o caçula dos Hooper achou melhor não perguntar – Jesse havia retornado sem seu suéter de lã. A chuva havia castigado o rapaz, no breve caminho que separava a casa de Ruby da sua. Seus cabelos louro-queimados estavam bagunçados e grudados em seu rosto, e sua camiseta preta estava grudada contra seu corpo.
        - E como foi lá?
        - Não tenho tempo para isso... – Jesse murmurou, passando pelo irmão rapidamente enquanto sacudia sua cabeça e espalhava água pelo chão da sala de estar. – Eu vou sair hoje. Aparentemente aqueles filhos-da-mãe com presas...
        - Shhh! – Dan exclamou, tapando a boca de seu irmão com uma de suas mãos. – Entendi o que quer dizer. Mas nós temos uma visita hoje.
        - O quê...? – ele fitou a porta da sala com o canto de seus olhos. Abriu um sorriso, em seguida. – Não acredito, Dan. Foi só eu sair por alguns instantes e você trouxe alguma garota para casa?
        - O quê? Não, Jesse!
        - Ela é gostosa?
        - Não é uma gar...
        - Uh, então eu posso ir lá ver, certo?
        Sem esperar a resposta do irmão, Jesse andou rapidamente em direção à grande sala de televisão. Antes de olhar pela porta, porém, ele se virou para Daniel e franziu as sobrancelhas.
        - Que tipo de cara traz uma garota para casa, e a coloca para jogar vídeo-game?
        Novamente não esperou a resposta do caçula e girou por sobre seus calcanhares, a tempo de dar de cara com o pequeno Benjamin. O garotinho usava sua blusa favorita, uma dos Sex Pistols, e segurava um joystick velho. Demorou um pouco para que eles entendessem que estavam se encarando pela segunda vez naquele dia. Mas quando Ben percebeu que o rapaz encharcado na porta da sala era também o seqüestrador de sua irmã, ele cambaleou para trás, deixando cair no chão o joystick e começou a gritar.
        - Ben? – Daniel surgiu logo atrás de Jesse, e correu em direção ao garoto. – Ben, o que houve?
        - Foi ele! – o garotinho abraçou Dan com força, utilizando-se do corpo do rapaz como uma proteção contra Jesse, que ainda estava atônito, tentando conectar os fatos. – Ele levou minha irmã! Foi ele, Dan! Foi ele, foi ele!
        O garoto apontou o dedo trêmulo para o mais velho do Hooper de um modo incrivelmente desesperado. Começou a chorar logo em seguida e afundou o rosto no peito de Daniel. Este se virou para seu irmão.
        - O que você fez?
        - Eu? – Jesse gritou – Eu não fiz nada!
        - Eu achei que você iria conversar com Ruby. Céus, Jesse! Você não consegue ficar longe de confusões? A irmã deste garoto desapareceu, e ele acha que foi você!
        - Eu fui conversar com Ruby. E ela é a irmã deste pirralho.
        Benjamin ainda chorava, com o rosto vermelho afundado entre as mãos pequenas. Daniel passou a mão pelos cabelos do garotinho, e se levantou, ficando defronte a seu irmão mais velho. Dos três garotos presentes naquela sala, Daniel Hooper era evidentemente o mais confuso.
        - Ruby desapareceu?
        - Não! Meu Deus, que confusão!
        - Ela sumiu sim – Benjamin soluçou. – Você sumiu com ela!
        - Ficou maluco? Ruby estava comigo o tempo todo, em casa. Ela está procurando por você feito louca! E você... Dan, por que ele está aqui?
        - Eu o achei vagando pela rua. Estava encharcado, procurando pela irmã.
        - Por Deus! Ruby deve estar desesperada, e você estão aqui, jogando vídeo-game! Quer fazer o favor de vir aqui, Benjamin? Vou te levar para casa.
        - Não – Ben gritou, começando a chorar novamente. Agarrou-se à uma perna de Daniel - Não deixe que ele me leve, por favor!
        - Jesse...
        - Não comece! Ruby está surtando em casa, e Roxy acabou de chegar. Provavelmente ela irá surtar também. E ainda assim, estamos os três aqui, conversando calmamente, enquanto elas acham que o irmão está desaparecido pelo mundo?

Um comentário:

  1. hhahahahahahhah capítulo hilario, dei pala aqui em casa.. desculpa a demora pra comentar, mas agora to aki. vc ve se nao me esquece e posta as musicas pra eu poder ler com elas!! o dia aqui hoje foi muiiiito bom e engraçado né?? hahhah bjims lov you e nao esquece de escrever pra mimm QQ

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